
"Esta exposição serve para assinalar os dez anos dentro do circuito da pintura. Ao todo são 40 quadros, entre eles alguns novos e outros que fui pintando ao longo destes dez anos", diz o pintor ao Cabolux.
Cores vivas, movimento e
energia são os ingredientes que Nélson Neves põe na balança para conseguir uma
certa harmonia e equilíbrio no resultado final, sejam eles quadros abstractos
ou figurativos. Neles podem ser apreciadas cenas quotidianas do folclore
cabo-verdiano, mas também incursões fora do âmbito insular, mais universais.
"Posso pintar
pescadores a arrastar botes, vendedoras de peixe, um agricultor com a enxada na
mão ou ainda crianças a brincar na rua, mas não sou um pintor do folclore,
desta ou daquela área específica. Não gosto dessas gavetas. Tenho a liberdade
de mexer em tudo no mundo da pintura e gosto de experimentar coisas novas. Há
pessoas que preferem as obras figurativas porque vêem aí uma realidade que lhes
é familiar. Outras, preferem as abstractas porque elas mesmas podem ser mais
activas e ver ali o que mais ninguém vê. Por isso, não me fico só por aquilo
que é tipicamente cabo-verdiano e tento ir um pouco mais além."
Nélson Neves nasceu em Santo
Antão e chegou ao Luxemburgo em 1980, com sete anos de idade. E foi precisamente
durante a infância que descobriu o mundo da pintura.
"Comecei
na pintura desde criança e com o tempo fui crescendo nesta arte, passando
também pela formação. Foi todo um processo natural e quando assim é, nada é
difícil, nada é forçado. As coisas saem espontaneamente e quando se gosta ainda
mais fácil se torna".
Em
2001 expôs pela primeira vez, no quadro da semana Cabo-verdiana (em Rodange), e
desde aí conta que as coisas mudaram.
"Até
então pintava para mim e a partir daí comecei a tomar a pintura mais a sério.
Foi-me abrindo algumas portas e hoje chamam-me para dar aulas de pintura em
liceus e escolas primárias. Não sou professor, mas se me convidam é porque
conhecem o meu percurso. A pintura deu-me também a oportunidade de viajar
bastante, conhecer outras culturas, organizar ateliers de pintura no
Luxemburgo, em S. Vicente, Praia e S. Antão. Se em França, no Luxemburgo ou em
Cabo Verde as pessoas conhecem Nélson Neves posso dizer que é graças à minha
pintura", reconhece o artista plástico.
Hoje,
trabalhar na pintura é um "privilégio", e quando chega o desafio de
enfrentar um novo trabalho a relação é de "entrega total", confia ao
Cabolux.
"A
pintura é uma grande paixão. Quando estou na fase de produção, o tempo não
existe e essa relação com a pintura é de entrega é total. Não importa o tempo
que passo à frente de um quadro, porque esse tempo, acompanhado pela música ou
em silêncio, é um privilégio."
Em
2008 foi convidado Ministério da Cultura do Luxemburgo para expor na cidade da Praia.
Diz que foi o acontecimento artístico mais marcante.
"O
que mais me marcou foi a minha participação na "Semana do
Luxemburgo", que decorreu na Praia, em Julho de 2008. Fui convidado pelo
Ministério da Cultura do Luxemburgo e pela primeira vez tive a oportunidade de
mostrar o meu trabalho na minha terra. A nível emocional foi uma experiência
muito forte. Emigrei com sete anos e passados tantos anos regressei para
mostrar o que aprendi lá fora."
Da
experiência que teve no terreno destaca a "potencialidade" entre os
jovens, a falta de material e formação, e reclama mais apoio à divulgação dos
trabalhos artísticos dentro e fora do país.
"Temos
muitos e bons artistas e também jovens pintores com talento. Trabalhei no
terreno em Cabo Verde e pude constatar essa potencialidade entre os nossos
jovens. Agora, o que lhes falta é material, formação e o apoio das pessoas.
Quando um jovem pinta e se lhe dá uma palavra de incentivo isso é já um grande
apoio para seguir nesta arte. Quanto ao trabalho dos nossos artistas devia ser
mais divulgado dentro e fora do país. Da mesma forma, a crítica de arte em Cabo
Verde é necessária. Não sei se ela realmente existe ou se anda desapercebida,
mas tem de se mostrar para o bem do crescimento artístico." Quanto
ao trabalho dos decisores políticos em prol da arte, Nélson Neves mostra-se
também crítico e diz que é preciso um "trabalho de "raiz".
"Há
todo um trabalho a ser feito pelos nossos decisores políticos. Um trabalho de
raiz que invista a sério na educação artística dentro do sistema de ensino, que
trabalhe com as crianças desde cedo. A arte é fundamental para o
desenvolvimento de um país e merece uma maior aposta", refere o
santantonense, que não vê com maus olhos a possibilidade de alguns artistas em
dar aulas.
"Mesmo
sendo alguém externo ao sistema de ensino, o artista seria sem sombra de
dúvidas uma mais-valia na formação das nossas crianças e jovens. Não só pela
experiência de vida diferente, mas sobretudo pela maneira como pode ensinar a
ver a arte. Já agora, porque não um liceu de arte em Cabo Verde?", desafia
o pintor.
A vernissage está marcada para as 19h
de hoje. A exposição tem entrada gratuita e pode
ser vista entre as 9h e as 19h no castelo de Betemburgo (13, rue du Châteaux).
Texto
e fotos: Henrique de Burgo
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