23/03/2013

Cabo-verdianos vítimas de "escravatura moderna" no Luxemburgo

Depois de na passada terça-feira o sindicato luxemburguês OGB-L ter acusado a Açomonta de praticar «escravatura moderna» através de subempreiteiros «duvidosos», surge agora a confirmação da polícia francesa de que a empresa alojava trabalhadores recrutados num edifício abandonado. Entre eles, cabo-verdianos.

Do alojamento ao transporte, passando pelo pagamento dos salários, entre os 300 e os 700 euros, tudo seria organizado pela Açomonta no Luxemburgo, do grupo português com o mesmo nome, diz à Lusa um trabalhador português de origem guineense, que pediu o anonimato.

Em 2011, o operário nascido na Guiné-Bissau, especializado em armações de ferro, foi recrutado para trabalhar no Luxemburgo por uma empresa em nome unipessoal, a Talentos e Oportunidades.

«Assinei contrato na rua, na rotunda do Areeiro [em Lisboa], não foi no escritório», conta o português, casado e com filhos, que estava desempregado há dois meses.

O armador de ferro recebeu um bilhete de autocarro e viajou com dois guineenses. À espera dos três homens, à chegada ao Luxemburgo, estava um dos diretores da Açomonta.

«Ele é que nos recebeu. Levou-nos para uma fábrica abandonada em França, numa carrinha. Estávamos lá 20», conta.

O edifício fica na antiga fábrica de Micheville, em Villerupt, em França, a seis quilómetros da fronteira com o Luxemburgo e a quatro do armazém que a Açomonta tem em Redange.
A Polícia Municipal de Villerupt confirma que o edifício abandonado foi adquirido pela Açomonta.
A empresa transformou o local em habitação «sem a devida autorização de construção, o que é proibido, porque é reservado exclusivamente a atividades industriais», diz o brigadeiro-chefe Raymond Hoffmann.

O chefe da Polícia lembra que no local viviam «trabalhadores africanos, alguns de Cabo Verde», a maioria «armadores de ferro a trabalhar no Luxemburgo».

«Vinham buscá-los numa carrinha da empresa para os levarem para o trabalho», conta. «Os trabalhadores queixavam-se que a Açomonta não lhes pagava o que lhes tinha prometido. Vinham a pensar receber bons salários e afinal viviam em condições de mendicidade».

Segundo o responsável da polícia, a empresa foi notificada para regularizar a licença de habitabilidade, o que nunca chegou a acontecer, levando a autarquia a transmitir o processo ao
Procurador da República, em França.

O local está abandonado há vários meses, segundo o chefe da Polícia. Mas na altura em que o trabalhador português lá viveu dormiam «quatro pessoas» em cada quarto.

Os vinte trabalhadores só tinham um fogão e uma casa de banho, e a fila para o único chuveiro arrastava-se «até à meia-noite, duas da manhã».

Durante o primeiro mês, o português trabalhou 11, 12 e mesmo 13 horas por dia, indica o mapa de ponto, que tem no cabeçalho o logótipo da Açomonta e em baixo, em letras mais pequenas, o nome da Talentos e Oportunidades. Mas depois de um mês inteiro a trabalhar, incluindo «muitos sábados», recebeu pouco mais de 300 euros. tinham nada», diz o emigrante português, que pediu para não ser identificado.
 
Fonte: RL

Sem comentários: